Por Antunes
Ferreira
Mau-olhado
diria a minha avó materna Maria da Assunção Prata Antunes, natural da aldeia da
Ponte na Beira Baixa. Era dada ao exoterismo sem saber o que era e como era. E
acreditava em bruxas, o que originava uns sorrisos de comiseração do meu avô
Braz Antunes, o senhor tenente da Guarda Fiscal que ia ao pálio nas procissões.
E que tinha uns bigodes encerados apontando para cima. Pequeninha e enrugada
assim sempre me lembro dela e em momentos menos felizes ou mais complicados
recordo o responso de Santo António para encontrar coisas perdidas ou a novena
ao santo Padre Cruz para curar todas as maleitas – e sem mezinhas, apenas com
rezas e devoção.
Este intróito
vem a propósito (virá?) do malfadado caso do ensaio clinico do medicamento que
causou cinco ou seis doentes graves, com um em morte cerebral. Tratava-se do
ensaio clínico com voluntários de uma nova molécula os quais já decorriam desde
Junho do ano passado e participado 108 pessoas, todas em regime de
voluntariato. Nunca tinha havido notificação de qualquer reacção adversa moderada ou
grave A molécula é produzida pela Bial a principal
empresa farmacêutica de Portugal e uma das maiores da Europa.
Os testes decorriam em França, numa unidade de
ensaios clínicos em França e os
resultados funestos levaram a que, naturalmente, eles fossem suspensos. Os doentes
que apresentaram sintomas graves estavam e estão sob observação no Hospital
Universitário de Rennes, "em vigilância permanente". A própria Bial,
que distribuiu um comunicado sobre o gravíssimo assunto informou ainda que um
dos voluntários internados está no serviço de reanimação em estado de morte
cerebral. A empresa farmacêutica portuguesa vincou ainda que o ensaio foi
aprovado pelas autoridades francesas, bem como pela comissão de ética em
França, e está de acordo com a legislação que enquadra os ensaios clínicos.
A Bial assegurou
ainda que está “fortemente empenhada em assegurar, em primeiro lugar, o
bem-estar de todos os participantes neste ensaio, bem como em apurar de forma
rigorosa e exaustiva as causas que estarão na origem desta situação”. A
ministra francesa da Saúde, Marisol Touraine, adiantou ontem, sexta-feira que
já foram abertos dois inquéritos para apurar o que terá sucedido. Paralelamente
Adalberto Campos Fernandes, o ministro da
Saúde português disse estar a acompanhar "com preocupação" o caso do
ensaio clínico do medicamento que causou a hospitalização de seis pessoas, em
França, mas manifestou confiança na empresa Bial.
Até ao momento em que escrevo esta crónica nada mais se avançou na
questão, Sabe-se que os temas que abordam questões da saúde são morosos, mas
têm de ser assim; ela é o maior bem que os homens têm e costuma-se dizer que só
se sabe o valor da saúde quando ela se perde. Mas o facto gritante é o
envolvimento de uma empresa farmacêutica portuguesa que num dos campos a que se
dedica corre o risco de vir a ser desacreditada contra a opinião que sobre ela
havia.
Portugal de há uns anos para cá tem sofrido tratos de polé por esta ou
aquela razão, nos domínios das finanças, da economia ou da política. São os
défices excessivos, são os PIB, são as PPP, são os swaps, são as eleições
diversas, são as coligações impensáveis, são as corrupções inacreditáveis, é
tudo isso a que leva que os de fora nos olhem de cenho franzido.
Isto não quer que estes aspectos negativos e muitas vezes criminosos não
existam noutros países. Mas é conhecida a fábula
do leão moribundo criada por Esopo.
É nos momentos mais difíceis que é muito mais fácil atirar pedradas. A
chamada União Europeia (melhor será desunião), o Fundo Monetário Internacional
e o Banco Central Europeu uniram-se na troika que não interessa a ninguém – a
não ser ao triunvirato que a formou. Já não nos bastava a crise e odienta
austeridade, e vem agora o ensaio clínico de um produto português. Os desastres
avolumam-se, investiga-se, criam-se comissões da mais diversa índole e no fundo
uma catrefa de mons parturiens.
Culpados – nicles.
Começo a pensar que a minha avó Maria da Assunção Prata Antunes, quando
falava em mau-olhado era capaz de ter alguma razão. E não sabia ela o estado em
que anos depois estaria o país, sobretudo depois da famigerada coligação que
governou (?) Portugal nos últimos quatro anos, bem como o cúmplice dela que é
conhecido por suposto PR. Nada tinha de pitonisa, nem habitava em Delfos, tinha
a sua casa na Rua de Infantaria 1 em Portalegre.
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