Por
Antunes Ferreira
Cada
vez estou convencido que a vergonha é coisa que caiu em desuso pelos ditos
políticos portugueses. Dia após dia os exemplos vão avolumando-se e o povo
ignaro assista a este festival de mentiras e despudor que é apresentado em
todos locais, nomeadamente em feiras, circos e fantoches de rua, com o que
antes era a ganapada que os aplaudia e hoje somos nós, os Portugueses, que os
aturamos e, por vezes, até os aplaudimos. Já ninguém, ou quase, que encolhe os
ombros e amocha quotidianamente.
Quando
Álvaro Vaz de Almada, conde de Avranches, no final da batalha de Alfarrobeira,
já não conseguia resistir aos seus adversários e via perto a morte, bradou “É
fartar, vilanagem”, mal sabia que esse seu grito se transformaria numa forma de
crítica desesperada numa ocasião em que as pessoas já não podem mais com quem
quer que seja, ou numa ocasião em que estão fartas de tudo e de todos e desenganadas. Neste momento que se vive no
nosso país o grito é, mais e mais, justificado: É fartar, vilanagem!
Carlos
Moedas, ex-secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro (?) Passos Coelho,
assumiu na terça-feira de manhã na sua audição no Parlamento Europeu, em
Bruxelas, que discordou “muitas vezes” com a política da troika, mas mostrou capacidade de
resposta, uma característica que considera importante como futuro comissário de
Investigação, Ciência e Inovação. Isto porque, no seu entender o pais
“precisava de mostrar credibilidade na Europa”.
E
disse mais: “Estive durante três anos a
ajudar no programa de ajustamento que foi muito difícil, foram sacrifícios
enormes, sempre reconheci a dureza e o sacrifício do programa. Portugal estava
num momento em que precisava de mostrar a sua credibilidade àqueles que deram
dinheiro”, defendeu, na resposta à eurodeputada do Bloco de Esquerda Marisa
Matias.
E
se por acaso, longe vá o agouro, uma nova crise se apresentar, espera que a
resposta política consista antes no investimento na ciência e inovação. No
entanto, Carlos Moedas defende que o seu trabalho passado demonstrou a
capacidade de resposta. “Sou uma pessoa que apresenta resultados e no Horizonte
2020 [o próximo programa europeu de financiamento da ciência] é importante ter
uma pessoa que apresenta resultados.”
Tem
o seu interesse verificar que um dos executantes mais empenhados na aplicação
aos Portugueses do diktat da troika, com a enorme violência que é conhecida
venha agora dizer que até discordou dessa receita malfadada. É bem o exemplo de não
ter vergonha na cara. Quando a dupla Passos e Gaspar se travestiu em Passos e
Maria Luís aplicou a nós, os Portugueses, a subida dos impostos, os cortes nas
pensões, até aos mais desprotegidos, renegando o contrato com elas assinado e
deitando às urtigas a afirmação de que o Estado é pessoa de bem (era), Moedas
lá estava acirradamente a implementar o desvario.
Agora,
no Parlamento Europeu que o examinou saiu-se com esta mentira, o
desavergonhado. Após três horas de questões ao futuro
comissário que deverá ficar responsável pela pasta da Investigação, Ciência e
Inovação, Carlos Zorrinho, do PS, que é membro efectivo da comissão de
Indústria, Investigação e Energia, comentou que Moedas "estava bastante
preparado e teve uma prestação claramente positiva". Mas, também disse que
a grande questão é saber se Moedas será mais leal às ideais do presidente eleito
da CE, Juncker, que fez do investimento uma das suas grandes
"bandeiras", ou à linha do Governo português de Passos Coelho.
"Quase imagino o que vai ser
o dia-a-dia de Carlos Moedas nos próximos tempos: de manhã receberá um
telefonema de Jean-Claude Juncker a dizer «investe, investe, investe»; ao fim
da tarde, Passos Coelho, que tem assento no Conselho e não tem feito nada para
aumentar o investimento nesta área, vai telefonar a dizer «corta, corta,
corta»", zombou Zorrinho, que ainda acrescentou que fica à espera de saber
"de que lado estará" o antigo secretário de Estado adjunto do
primeiro-ministro nas suas funções como comissário.
Marisa Matias, do BE e João
Ferreira afinaram pelo mesmo diapasão, naturalmente com algumas diferenças não
substantivas. Ou seja Moedas está bem preparado para quê? Dispõe de 80 mil
milhões até 2020 para apoiar, implementar e desenvolver as políticas de
inovação, ciência e Inovação. Ao contrário do que fez enquanto membro do
(des)Governo de Passos & Portas, agora na Europa vai gastar o que
“desgastou” em Portugal. Será ele capaz de o fazer? Como nos primórdios da
televisão neste país triste e desgraçado, se dizia “O programa segue dentro de
momentos” e isso representava umas horas de ecrã negro como a noite mais negra,
há que esperar pelos resultados do preparado mas desavergonhado Carlos Moedas.
Até lá, benza-o a Senhora do Agrela, que não há santa como ela.
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