Passos e Montesquieu
Charles-Louis de Secondat, Barão de Montesquieu
Por Antunes Ferreira
Seja-me permitido recordar o que a maioria das pessoas
sabe, mas que por vezes, bastantes até, esquece – ou quer esquecer-se. A
Revolução Francesa mudou a França, mas também a Europa e até o Mundo. É ponto
assente que os acontecimento que se verificaram no século XVII durante dez anos
(1789 – 1799) deram aos cidadãos os princípios políticos consubstanciados no
lema que se tornou uma realidade na Terra: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
É o momento em também se consolida a teoria dos três poderes.
A teoria dos três poderes foi consagrada pelo pensador
francês Montesquieu. Baseando-se na “Política”, de Aristóteles, e no “Segundo
Tratado do Governo Civil”, de John Locke, Montesquieu escreveu a obra “O
Espírito das Leis” (1748) em que traçou os parâmetros fundamentais da
organização política liberal. Os três poderes eram o legislativo, o executivo e
o judicial. E continuam a ser.
O filósofo iluminista foi o responsável por explicar,
sistematizar e ampliar a divisão dos poderes que fora anteriormente
estabelecida por Locke. Montesquieu acreditava também que, para afastar
governos absolutistas e evitar a produção de leis tirânicas, seria fundamental
estabelecer a autonomia e os limites de cada poder. As teorias defendidas por
Montesquieu exerceram uma poderosa e profunda influência no pensamento político
moderno. Elas inspiraram a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,
elaborada em 1789, durante a Revolução Francesa.
Neste país triste e desconchavado que é Portugal, a
liberdade que nos foi trazida pelo 25 de Abril (ainda se recordam do que foi?)
assentou imediatamente na teoria dos três poderes. Na vigência do “Estado Novo”
ela tinha sido vilipendiada, arremedando-se através da Constituição
corporativo-fascista de 1933, que contemplava os três poderes iguais, só que
um, o executivo, mais igual do que os outros. A mente rebuscada de Oliveira
Salazar fora encontrar este artifício para o regime autoritário em que ele era
o chefe.
Por cá, mas já no ano corrente, 2014, um novo e jovem
chefe do Executivo(?) resolveu fazer uma nova revolução e elaborar uma nova
teoria política. Ele defendeu, enquanto poder legislativo, que deveria “dar
conselhos” ao poder judicial, já que este (ou pelo menos uma parte deste, ou
seja o Tribunal Constitucional) se andava a comportar mal. Os juízes do Palácio
Ratton tornaram-se assim, uma nova “força de bloqueio” expressão que Cavaco
Silva já utilizara nos fins dos anos 90. Na altura, Cavaco ficou conhecido pela
frase calina “deixem-me trabalhar!”.
Nesta semana PC (Passos Coelho) declarou que o
Tribunal Constitucional - a quem pedira a “aclaração” dos três artigos do
Orçamento para este ano que os juízes tinham declarado inconstitucionais,
pedido a que o TC torceu a orelha - com esta sentença punha em risco o final do
“programa do ajustamento estrutural” que o seu (des)Governo vinha executando
servilmente perante a famigerada troika. Quer isto dizer que o tribunal da rua
do Século, em suma, não o deixava trabalhar. Mas o mais gritante foi o que
disse quanto ao “recrutamento” dos juízes do TC, pois afirmou que tinha de
haver uma peneira mais fina para eles serem escolhidos.
Estará Passos contra a Revolução Francesa? Estará
Coelho contra Montesquieu? E por arrastamento, dado que são da mesma cor
política, a laranja, estará Cavaco contra a Revolução Francesa? Estará Silva
contra Montesquieu? E ainda nessa enxurrada alaranjada estará Assunção contra a
Revolução Francesa? Estará Esteves contra Montesquieu? Penso que não, mas as
atitudes do (des)Governo português em termos financeiros e económicos pode
indiciar que nem não nem sim. Como diria o nosso Eça – nim.
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