sexta-feira, 30 de maio de 2014

CONTRIBUTOS EXTERNOS

Crónica gamada, com a devida autorização, ao blogue A Minha Travessa do Ferreira, do Henrique Antunes Ferreira



A QUANTO OBRIGAS


Vem

o Santo


António…



Antunes Ferreira
Desce a escada, põe-a ao ombro, leva-a para o camião, senta-se na beira do passeio e acende um cigarro; na embalagem lê-se em letras carregadas FUMAR MATA,
mas que se lixe. Fuma desde os oito anos, começou com barbas de milho enroladas em papel de jornal, vai com quase cinquentas e ainda não morreu. Puxa uma fumaça, depois outra, e levanta os olhos. No candeeiro, no topo dele, está a grinalda que acabou de colocar. Um vento temporão arrancou parte dela. Porra!, fica assim.

Os santos que dizem populares vêm a caminho, para o Santo António falta pouco mais de duas semanas. Os arquinhos, os balões, a sardinha assada ainda não estão na pole position, mas nas boxes aquecem os motores a carrascão. O povo diz que a procissão ainda nem saiu do adro e ele ali, desencantado, está-se nas tintas para o António, para o João e para o Pedro, que se lixem. Mas as ruas têm de ser já engalanadas, arrota o presidente da Junta que candeia que vai à frente alumia, ele diz alumeia, e ninguém discorda, muito menos na corte celestial, pois São Bento também diz o amém.

Fábrica fechou
A fábrica fechou, os patrões cavaram, as máquinas também, os piquetes chegaram atrasados para impedir a fuga de uns e das outras, não houve cartazes que lhes valessem, a CGTP e a UGT mandaram um tipo e uma gaja para nada fazerem e só falarem para as câmaras das televisões. Ele, diplomado em finanças, director administrativo, estava entre os desempregados que o interrogavam primeiro com cenho franzido, será o gajo do inimigo, espião avençado, mas em seguida com olhares cansados da revolta, à espera de que ele fizesse – o quê?

Depois os pulhas que estão em Belém e São Bento e por Lisboa fora tinham decretado que o subsídio de desemprego fosse restringido e só concedido em determinadas situações. Reformas, aposentações, pantufas, banco de jardim, bisca lambida paraquedizavam-se num horizonte carregado de nuvens negras prenunciando raios e trovões sem recurso a guarda-chuvas. O desemprego galopava e os velhos (a partir dos quarenta anos) faziam contas ao futuro.

Apaga a pirisca e atira-a para a sarjeta, errando qual escarro mal endereçado por falta do código postal. No camião o colega ressona, já leu A Bola, a selecção estagia em Óbidos, faltam uns quantos, o Cristiano Ronaldo e o Pepe e o Coentrão que jogaram a final na Luz e até ganharam a Champions. Uma merda, a malta apanhou logo a Alemanha no grupo da morte. Já não bastava a Merkle. E os Estados Unidos e o Gana. Foda-se. 

Quem devia marchar eram os de Belém & São Bento
E como veio ele, doutor e tudo, parar aqui, servidor precário duma Junta de Freguesia? A colocar festões para os santos ditos populares? Populares uma gaita; porque não conseguira outro trabalho, estava velho… nos quarenta e sete. As sardinhas estão pela hora da morte, os balões só de loja chinesa bem como as grinaldas, e quanto aos foguetes o poder tinha-os apagado por falta de verba. As marchas devem sair, mas quem devia sair era a corja no poleiro, esses marchavam bem.  que E o senhor presidente da Junta, dizem que meteu ao bolso umas notas gradas, comprou o material sem factura nem número de contribuinte, não concorre ao automóvel topo de gama semana a semana, mas o que lhe calhou já lhe canta no bolso.

Durante dois anos a andar aos caídos, com a filha na faculdade e o filho a acabar o liceu - ele ainda diz assim, à moda do antigamente -, foi-se safando porque a mulher estava no Ministério das Finanças (ironia suprema, ambos se tinham conhecido no então ISCEF) como chefe de repartição. Mas, num daqueles rasgos geniais do Gaspar, fora aconselhada a meter a reforma, porque com o que chamam agora o sacana do downsizing, poderia ser considerada excedentária e achar-se um dia no olho da rua como ele. Saiu pelo pé dela directamente para o reforma, velha de quarenta e seis anos, procurar emprego nem pensar. E além disso com a pensão. 

Portas & Coelho
Mas até nessa situação foi roubada, o Estado que se dizia pessoa de bem, marimbou-se na Constituição e no contracto que fizera com os funcionários, aliás trabalhadores da Função Pública, modernice, e vá de cortar nas reformas que se presumiam sagradas. Este Governo dos senhores Coelho e Portas e outros sequazes tornou-se quadrilha dos quarenta ladrões, embora ninguém saiba onde mora a caverna carregada de euros.

O pior, o Ali Babá, o maior culpado destes tempos do 25 de Abril – ainda se recordam do que foi, é e será? - também os roubou: Cavaco Silva, 
O rapaz
de Boliqueime
vingativo, emproado, múmia, padrinho do Executivo da sua cor nem tem comparação com o Tomaz: consegue dar mais gafes do que o último dos presidentes do salazarismo/marcelismo, tal a quantidade de bacoradas em que é especialista. 
Falava-se na dona Gertrudes, mas a dona Maria (II), sobrinha do hospedeiro do quarto alugado em Campo de Ourique pelo rapaz de Boliqueime e que com ele casou, ultrapassou na burrice e no maneirismo a esposa do almirante de triste memória.

Senta-se ao lado do motorista, abana-o para o acordar, ó meu sacana a Junta não te pagar para dormir e arrancam. E dá por si a pensar no downsizing, que em português quer dizer  achatamento ou diminuição de tamanho e é uma das técnicas da Administração dos dias de hoje, que segundo os bandidos tem por objectivo a eliminação de pessoal dito desnecessário, para manter os lucros ou aumentá-los, pois ela é focada no centro da pirâmide hierárquica, ou seja na área de tramar o pessoal, a que chamam recursos humanos e da qual não há... recurso.
só as que a Câmara persiste em casar
Chegam ao novo candeeiro. Repete a celebração, o ritual da escada, grinaldas, vento, etc. Na rádio do camarada condutor uma voz esganiçada regouga que “vem o Santo António, depois São João, depois vem São Pedro, para a reinação”Um tipo passa num triciclo motorizado, com vasos de manjericos ainda sem bandeirinhas. Os desgraçados também estão caríssimos e já não casam ninguém. A não ser as noivas que a Câmara Municipal persiste em matrimoniar.

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