sexta-feira, 22 de maio de 2015

CONTRIBUTOS EXTERNOS

A caça ao voto

Por Antunes Ferreira

A apresentação do programa de Governo do Partido Socialista provocou, tal era de esperar, ondas de choque diversas. No debate quinzenal da Assembleia da República a coligação no poder disse cobras e lagartos sobre o documento que deverá ser aprovado no dia 6 de Junho na assembleia magna do PS.O programa  foi então motivo de ataques acerbados cujos autores iam do nosso primeiro Passos Coelho até ao líder parlamentar dos laranjas Luís Montenegro. O CDS, naturalmente, também participou na agressão colectiva.

Por outro lado, Aguiar Branco iniciava o ciclo Sócrates, tema que servia, serve e serviria de arma de arremesso contra António Costa. Um verdadeiro leit motiv para a maioria no poder. O ministro da Defesa chegou mesmo a afirmar que o Partido Socialista queria um modelo de governação "muito à engenheiro Sócrates", defendendo que a apresentação do projecto de programa eleitoral dos socialistas "é mais uma sondagem de ideias, já foi feito esse ensaio com o cenário macroeconómico que aconteceu num primeiro momento, agora é o projecto de programa".

As acusações  iam-se acumulando. Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, afirmou na quinta-feira última que PS, PSD e CDS-PP "quanto mais juram mais mentem", Referia-se às  alterações introduzidas no sistema da Segurança Social  e as que pretendem fazer na Taxa Social Única ,TSU. "O actual Governo anunciou um novo corte de 600 milhões de euros nas pensões e reformas para 2016. Por seu turno, o PS prepara-se para aprofundar a sua contra-reforma da Segurança Social de 2007, envolvendo agora também a redução da TSU para as empresas, tal como PSD e CDS, e que, ao contrário do que se vem propalando, a mantém no seu projecto de programa eleitoral como uma medida a implementar a prazo. Aqui o recuo foi: 'não sendo para já, será mais à frente'"

Ora bem, estava-se em terreno propício à contenda: a Segurança Social onde o PS defende uma gestão sustentável e transparente dela que passaria por encontrar novas fontes de financiamento. E também promete dar prioridade à "avaliação rigorosa" do sistema de Segurança Social, a fim de devolver a confiança aos pensionistas e garante que não serão feitos mais cortes nas pensões. Ou seja defende-se uma gestão sustentável e transparente da Segurança Social, que passaria por encontrar novas fontes de financiamento e pelo combate à fraude e evasão contributiva.

Para compor o ramalhete surgiu Paulo Portas que avisou “com amizade” que a Segurança Social é um campo perigoso e não admite experimentalismos. O vice-primeiro-ministro dava assim a sua achega à questão, atirando mais achas para a fogueira ou jogando-lhe petróleo, o que é ainda pior. Mas quem conhece Portas sabe o que vale a palavra dele, o que adverte e o que jura que tomou uma decisão irrevogável para de seguida e face a novas ofertas revoga-a irrecusavelmente.

Estava instalada a polémica sempre saudável em democracia, mas a deturpação das intenções, promessas e argumentos significava (e significa) que isso não tem cabimento porque os intervenientes não querem: estamos em ano eleitoral e a pré (?) campanha está no Parlamento, na rua, no procedimento dos cidadãos, de acordo com o que pensam e que os concorrentes tentam instilar-lhes como as propostas mais aliciantes.

É a caça ao voto que todos recusam terem entrado por esse caminho ínvio, mas que todos também praticam ainda que sem espingarda nem licença de caçador. Portugal é (também) isto. Poderá argumentar-se que pelo Mundo fora – ou, pelo menos nos países onde há liberdade e democracia – a prática é constante e inevitável.

Mas querem recordar um exemplo histórico? No Parlamento britânico, comentando o andamento da guerra e respondendo a interpelações dos trabalhistas, na oposição, o Senhor Churchill  referindo-se à escalada dos bombardeamentos afirmou convictamente que se os alemães bombardeavam Londres, Birmingham, Liverpool e outras cidades da Inglaterra também em retaliação os bombardeiros da  Air Force despejam toneladas de bombas sobre Berlim,  Frankfurt, Colónia, Hamburgo  e outras.

O Senhor Clement Atlle, líder trabalhista, que viria a suceder a Churchill no prédio número 10 da Downing Street, respondeu-lhe “mas que ganhamos nós com isso?” Estava a aproximar-se o final da II Guerra e as palavras de Atlle ficaram na História. E ainda não abrira a hunting vote, ou seja a caça ao voto.
                                                                                                                                                                

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