segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

CONTRIBUTOS EXTERTNOS

Mais um textículo do Henrique Antunes Ferreira, que anda 

pelas Índias onde sofreu um acidente e que aqui continua a 

relatar



A doença e o beijo

Antunes Ferreira

No meio das chatices em que estas pseudoférias têm sido férteis, hoje a dermatologista depois da consulta pelo meio-dia receitou-me novos medicamentos e disse que as coisas demoravam o seu tempo, mas que lhe parecia estarem a melhorar. Aliás quer o Zito Menezes que me acompanhou bem como a Raquel eram da mesma opinião. Fomos depois, mais tranquilos, almoçar ao Riviera debruçado sob o Mandovi também com a minha cunhada Maria Alice que aqui igualmente veraneia…) e regressámos a casa deviam ser umas quatro da tarde.

Estava preparado para fazer uma sesta e nisto telefona a Dr.ª Flora dizendo que estivera a repensar sobre o assunto e preferia que outro médico me visse, para ter uma outra opinião. Lá foi a Raquel de riquexó ao consultório da dermatologista pois ela escrevera uma carta para o seu colega. Às seis e meia da tarde estávamos na Clínica do Campal. Ia como o coiso mais apertadinho como podem imaginar, pois o homem era cirurgião dermatológico. Com o meu habitual pessimismo já me via sem a perna esquerda…
Porém o Dr. Bossuet Afonso cujo pai também médico a médico a Raquel conhecera na juventude dela foi um tipo muito simpático falando um Português excelente disse-me (nos, ao Zito e à minha cara metade) que não havia nada a acrescentar ao diagnóstico da Professora manteve a medicação, acrescentou mais duas mezinhas e disse-me que em Goa ninguém precisava da minha perna e por isso eu ficaria com ela. Só não acrescentou que eu era um maricas – o esculápio era um sujeito bem-educado – e mandou-ma na paz do Senhor… Creio que já o escrevi, mas, por cá os católicos são mesmo… católicos.

Naturalmente que regressei a casa muito mais confiante. Tinha apanhado um valente susto (felizmente até usava cuecas castanhas). Toda a malta amiga telefonava para saber da opinião do Dr. Afonso; a solidariedade é um facto e as notícias correm mais depressa do quem TGV. Pelo caminho ainda fomos a uma farmácia onde toda a gente falava Português (dois cavalheiros e uma dama, sem do um deles até era sportinguista, o que me levou a felicita-lo juntamente com o Zito) Ainda há bastante gente, sobretudo os que estudaram no liceu Afonso de Albuquerque, mas, claro duma geração que se vai finando…

Pelo caminho retomei a conversa que tínhamos tido ao almoço e que originava um enorme ponto de interrogação: um povo que criara a Kama Sutra, que edificara os templos de Kajurao e Konark, onde as paredes de pedra são todas cobertas figuras eróticas até mesmo pornográficas (eu vira os templos e os actos sexuais explícitos que metem homens e mulheres, homens e homens, mulheres e mulheres e atá cópulas diversas com animais). Não permite o beijo no cinema. Mas que raio de situação.

Zito disse-me que, ainda com reservas, já se trocam beijos nos ecrãs e como lhe respondi sobre a quase desaparição do casamento formal em Portugal, como de resto pela Europa, com os casais a viverem em comum sem qualquer certidão matrimonial, o médico que vê a RTPI quotidianamente, sabia perfeitamente disso, mas afirmou-me que tais práticas ainda eram muito raras na Índia e em especial em Goa. E de novo a religião. M alguns restaurantes já se veem casalinhos trocando algumas carícias. Mas, trata-se de casos ainda esporádicos.

 Fico a pensar que nesta terra bendita as diferenças continuam abissais. Os próprios católicos, ainda que não o digam, acreditam nas castas, tal como vivem com Deus. A esmagadora maioria não refere a questão, mas ela está no espírito e nas cabeças das pessoas.


Mau estou a misturar doenças com beijos. Cada vez mais sinto que a velhice me vem conquistando a passos largos. Ainda que comparado com essa constatação do grupo de terroristas sanguinários, que se auto proclama ser o “Estado Islâmico” não… comparação. Por vezes dá-me para cada um que, cada duas é um par…

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